Nesta última semana de agosto, vamos apresentar e explorar o conteúdo do livro Escolhendo Jesus, através de uma série de textos publicados na obra. Ao término, será possível encontrar pistas de ação que auxiliarão o trabalho na sua paróquia. Confira!
Por uma evangelização com a juventude
Welder Lancieri Marchini
A juventude talvez seja o grupo social que mais vivencia as mudanças e o choque entre as gerações. Diferentemente dos adultos, os jovens não têm como base as experiências passadas e por isso precisam dos adultos como referência e amparo para a transição da infância à vida adulta. Contudo, de forma alguma devem ser infantilizados. Devem ser respeitados em suas faculdades e competências e instruídos, mas não coagidos a escolhas e condutas.
O Documento de Aparecida (DAp 30-32) traz a definição da evangelização como a ação da Igreja que leva ao mundo a presença do próprio Jesus, que por sua vez não pode ser entendido senão no contexto de seu Reino. Mais que fortalecer as estruturas eclesiais (ser, segundo o DAp, uma paróquia de manutenção), a comunidade cristã é chamada a ser sinal de Jesus diante da sociedade, tornando-se presença da sua mensagem e do seu Reino (ser uma pastoral missionária).
Mas, diante dessa mudança de paradigma pastoral, muitas vezes a comunidade cristã e as lideranças comunitárias se veem sem saber como estabelecer novos métodos eficazes de trabalho pastoral, principalmente no que diz respeito à evangelização da juventude de participação eventual. As práticas pastorais oscilam entre o institucional, que tem como estratégia básica os antigos grupos de jovens, sejam eles de linha carismática ou da Pastoral da Juventude (PJ), e a religiosidade de evento, assumida pelos acampamentos da Canção Nova ou mesmo a JMJ ou outros eventos promovidos pela Igreja.
Os tempos atuais trazem a necessidade de uma personalização dos trabalhos pastorais, para que levem em consideração o momento histórico e a dinâmica vivida por cada cidade ou mesmo cada comunidade ou grupo juvenil. Uma característica que se torna cada vez mais constante é que a presença da Igreja se estabelece de maneira difusa e não mais central. A antiga praça da matriz dá lugar a templos que são construídos cada vez com menor visibilidade. Também nas estruturas pastorais somos chamados a trabalhos cada vez mais descentralizados, que atinjam os jovens em seu contexto.
Como capacitar os grupos juvenis para que sejam espaços coerentes com as práticas e ensinamentos cristãos? As lideranças devem ser formadas. O protagonismo juvenil não acontece sem uma sólida e sistemática formação – humana, social ou teológica.
Sobre a formação cabem duas pequenas reflexões.
Primeiramente, as dioceses e organismos eclesiais, como congregações religiosas, movimentos e serviços, precisam estar atentos às realidades locais. O trabalho com os jovens acontece no cotidiano e na convivência e as lideranças que trabalham com esses jovens precisam de formação. É mais fácil para os organismos e dioceses oferecerem formações em um âmbito mais global, cultivando, por exemplo, as escolas diocesanas de formação de lideranças juvenis ou semanas de formação de abrangência regional ou nacional. Assim, fi ca mais fácil o acesso a materiais, assessores e reflexões em âmbito nacional, e não se perde o contato com as comunidades e grupos locais.
A outra reflexão sobre a formação diz respeito à participação da pastoral juvenil na sociedade civil. Ela muitas vezes tem origem em movimentos sociais extraeclesiais, ou seja, movimentos ecumênicos, como a comunidade de Taizé, e sociais, como ONGs de cunho ecológico ou sociopolítico, que se mostram cada vez mais propícios para a criação da identidade juvenil, inclusive do jovem católico.
Existem cursos – oferecidos por organismos sociais e mesmo universidades – sobre as realidades sociais nas quais os jovens estão inseridos que podem ser aproveitados para a formação das lideranças da pastoral juvenil.
O vínculo do jovem com a sociedade é importante. Se o jovem se sentir obrigado a optar entre a comunidade cristã e outro grupo social, provavelmente a comunidade cristã sairá em desvantagem por ter métodos pouco atrativos aos olhos dos jovens. Além disso, uma pastoral que assuma a postura de fechamento diante da sociedade se mostra pouco eficaz. A comunidade cristã é chamada a responder aos anseios e questões do jovem atual e não a incentivá-lo a se fechar como se a Igreja fosse um oásis ou um gueto. A vida plena – horizonte do trabalho pastoral – está na realização do ser humano que vive no mundo concreto. Assim, ser cristão se caracteriza muito mais por sua dimensão existencial que por uma adesão institucional.
O agente que acompanha a pastoral juvenil, seja ele jovem ou não, precisa cultivar a postura de empatia. Cultivamos a empatia por alguém quando nos colocamos em seu lugar, buscando entender o mundo a partir da sua perspectiva, entendendo suas motivações, frustrações e anseios. Essa postura de empatia é desenvolvida quando a liderança da pastoral juvenil acompanha a vida civil do jovem, conhece sua realidade escolar, familiar e social. Não se trata de ser um “entrão” ou questionador. Mas de assumir uma postura de interesse e participação.
Uma pastoral que queira atingir os jovens e dialogar com eles deve levar em conta a emergência da subjetividade e o anseio de participação da pessoa. O jovem quer, antes de tudo, fazer parte. Alguém que não se sente parte não se enxergará nos processos pastorais e estará sempre na zona da participação eventual. Além disso, é imprescindível estabelecer um diálogo entre a fé professada e a vida cotidiana. Os conteúdos doutrinários são por demais teóricos e sem sentido para o jovem de participação eventual. Se esses conteúdos não alcançam sua vida prática, ele os descarta.
Faz-se necessário assumir novos métodos e novas linguagens na evangelização da juventude. No contato com os jovens, a pastoral é chamada a agir na perspectiva de uma evangelização que consiga dialogar com as diferentes circunstâncias culturais que se fazem presentes na vida dos jovens (DAp 100,d).
No âmbito comunitário, é necessário que as organizações saibam estabelecer um diálogo entre as estruturas eclesiais e os indivíduos que delas participam. A instituição deve buscar se sustentar, mas seus membros não podem ser anulados em função disso. Uma instituição voltada para seus membros só é possível quando seu serviço preza a construção da autonomia e da experiência subjetiva.
A comunidade que quer uma pastoral juvenil eficiente deve investir material humano e econômico. É preciso criar espaços de convivência. Pode ser um passeio no parque para um lanche, pode ser uma sessão de cinema na própria comunidade ou na casa de um dos jovens, mas deve ser também o encontro de formação, que para atrair os jovens precisa cultivar uma linguagem própria, utilizando elementos artísticos e que demandam investimento e participação da comunidade.
A FIGURA DO PAPA FRANCISCO E A CNBB
Ao falarmos do trabalho de evangelização da juventude nos últimos anos, somos chamados a falar também do Papa Francisco, que se mostra uma fi gura carismática e encantadora, atraindo uma parcela de juventude para o ambiente eclesial. Seu modo de ser e sua mentalidade parecem ter trazido um novo respiro à Igreja.
Um dos momentos mais expressivos de seu ainda breve trabalho foi a Jornada Mundial da Juventude, evento acontecido em 2013 no Rio de Janeiro. O grande número de participantes nas celebrações na praia de Copacabana mostrou a adesão dos jovens à sua fi gura. Mas aqui precisamos olhar para essa realidade sob outro viés. O Papa é também uma fi gura midiática. Para muitos jovens, a JMJ não passa de um grande evento, e para muitos cristãos o Papa é alguém simpático que diz o que, para eles, é importante.
Muitos são os momentos em que o Papa Francisco desafi a os jovens a assumirem seu compromisso na Igreja. Há a exigência de que o jovem saia da posição de espectador para se tornar protagonista ou, segundo os termos que utilizamos aqui e que acompanham as refl exões do Documento 105 da CNBB, sujeito eclesial.
Mas a maior contribuição de Francisco para o nosso trabalho pastoral, até o momento, é a encíclica Evangelii Gaudium, na qual o Papa traz a alegria como característica do seguimento de Jesus. Essa alegria, que se faz presente na fi gura de
Francisco, alcança muitos jovens, não apenas aqueles que estão na Igreja (que identificamos como jovens religiosos), mas também aqueles de participação eventual. Francisco se transformou em fi gura simpática e midiática que já inspira uma postura de santidade devido às suas iniciativas de acolhida daqueles que o procuram. Em sua relação com a juventude, vemos que o Papa consegue cativá-la por falar ao mesmo tempo com ímpeto e ternura.
O carisma de Francisco ainda não se concretizou em mudanças efetivas nas estruturas eclesiais, muitas vezes pouco acolhedoras e eficazes. Reformar as metodologias do trabalho de evangelização e da comunicação com a juventude também se faz necessário e o Sínodo sobre a juventude é um momento privilegiado
para que isso aconteça.
A Evangelii Gaudium, além de trazer a alegria do Evangelho como parâmetro da vida cristã, trata dos métodos de evangelização. Ao propor a imagem de uma Igreja “em saída” (EG 20-24), o texto nos impele a sermos uma Igreja que sai ao encontro do mundo. Muitos jovens não participam efetivamente das 109 estruturas comunitárias. Ir ao encontro de tantos que também podem experienciar a alegria do Evangelho faz parte da missão da Igreja (cf. Mt 28,19-20).
Ao oferecermos ao jovem uma Igreja alegre e que vai ao encontro de sua vida concreta, podemos criar ambientes de convivência e, consequentemente, uma relação de empatia. O jovem é mais seduzido pelas convicções pode construir a partir do encontro com Jesus do que pelas teorias da doutrina. Por isso, a doutrina deve estar presente na evangelização dos jovens, mas em segundo plano. O anúncio querigmático, ou seja, o anúncio do próprio Jesus, traz consigo um forte poder de sedução aos jovens que buscam referenciais para sua vida.
O objetivo da pastoral juvenil é criar espaços para que, sem moralismos e julgamentos, os jovens elaborem projetos de construção humana que aconteçam comunitariamente. Buscaremos trazer algumas inspirações de como esses projetos de evangelização podem acontecer, lembrando sempre que eles se concretizam de maneira diferente em cada comunidade e que não há “receitas”, mas pistas e inquietações.
Pistas de ação:
Os trabalhos de evangelização juvenil de sua comunidade são trabalhos com a juventude ou para a juventude?
Os planejamentos e organizações comunitárias favorecem o trabalho da pastoral juvenil?
O Papa Francisco pede uma “Igreja em saída”. Os jovens de sua comunidade se relacionam com a sociedade que os cerca? Quais são as iniciativas de trabalho dos jovens com aqueles que estão fora da Igreja?
Os jovens se sentem protagonistas na comunidade ou pelo menos são incentivados a assumir este papel?
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